domingo, 9 de agosto de 2015

Yoga e Controle

Na cabeça das pessoas a palavra yoga está, em geral, associada de alguma maneira ao conceito de controle, de forma que, quando se pensa em yoga, se pensa em controle do corpo, controle da respiração ou controle da mente. No entanto, a palavra controle nos dá inevitavelmente uma ideia errada sobre a disciplina de yoga, que está muito mais ligada a uma observação amorosa e inteligente do que a uma rigidez controladora.

A ideia de controle associada ao yoga não é, contudo, um mero erro fortuito. A definição de yoga na principal escritura de yoga, o Yogasutra de Patanjali, diz que yoga é nirodha das atividades mentais (yogah citta-vrtti-nirodhah), sendo que o significado mais imediato de nirodha é mesmo controle ou supressão. Mas nirodha, como veremos neste artigo, também pode ter outro significado, muito mais adequado à definição de yoga.

A grande fantasia das pessoas é a fantasia do controle. A fantasia dos pais é controlar os filhos; a fantasia do patrão é controlar o empregado; do marido, controlar a mulher, e vice-versa; do governo, controlar o cidadão; do professor, controlar o aluno; da indústria, controlar o consumidor, e assim por diante. Quando nos deparamos com yoga, a mesma fantasia naturalmente entre em cena: o yogi quer controlar sua mente.

O controle, contudo, é apenas uma fantasia da mente humana. Ninguém controla nada. Não controlamos o mundo, por mais que o avanço da tecnologia nos faça acreditar nisso. Não controlamos as outras pessoas. Você não tem sequer controle sobre o seu próprio corpo; se tivesse, não deixaria ele ficar gripado, por exemplo, apenas para exemplificar com um fato banal da existência. Com relação a nossa própria mente, tampouco temos controle. Você não controla seus sentimentos, do contrário não ficaria zangado, ou triste. Você não controla o seu conhecimento, pois, se controlasse, você seria sem dúvida o gênio maior da humanidade, e já não teria lugar na sua estante para entulhar prêmios Nobel. Infelizmente, nós conhecemos apenas o que, com muito esforço e apesar de tudo, conseguimos conhecer, e não o que desejamos. Aliás, você não controla nem os desejos que passam pela sua mente, eles apenas surgem! E quantas vezes não são desejos inadequados, que você não teria se pudesse? Onde está então o controle? Se tivermos o mínimo de maturidade com relação ao entendimento da nossa mente, veremos que não a controlamos. Os mestres de yoga, portanto, não podem estar dizendo que devemos controla-la, e de fato não estão.

Em primeiro lugar, por que alguém desejaria controlar a mente? A resposta parece óbvia: porque ninguém quer se sentir frustrado, ou triste, ou irritado, e todas essas condições são condições da mente. Controlar a mente implicaria impedir todas essas condições de se manifestarem na mente e, portanto, eu me sentiria bem! Não é isso que todos estamos buscando: evitar todas essas emoções identificados com as quais nos sentimos mal? Não e por isso que precisamos tanto de diversões, de distrações, de drogas, de remédios? Pois é, mas yoga não segue essa mesma lógica.

Yoga não é como um remédio antidepressivo que impede que você tenha emoções. Yoga é aquilo que faz você compreender a si mesmo como distinto da mente, com todo o pacote de emoções incluído. E, se o yoga quer mostrar para você a sua distinção com relação à mente, por que ele estaria ao mesmo tempo interessado em fazer você controlar essa mente que é distinta de você? Pois, se você não está perdido na identificação com os processos mentais, você não tem nenhum interesse em controlá-los!

Isso é muito interessante. É comum na nossa sociedade, por exemplo, as pessoas em eventos sociais se embebedarem para poderem fazer e dizer coisas que elas não fariam e diriam sóbrias. Mas, muitas vezes – na maioria delas talvez – a pessoa está plenamente consciente de si, mas usa o álcool como uma desculpa para ter a licença para se comportar de modo diferente do que faria normalmente. Porque depois ela pode dizer, “Ah, aquilo? Mas eu estava completamente bêbado. Eu mesmo não faria aquilo.”

Se o eu sóbrio é diferente do eu bêbado, então eu não tenho nenhuma pressão por “controlar” o bêbado. Ele pode ser livre para fazer o que quiser, porque eu sou distinto dele. De modo similar, se eu sou distinto da minha mente, das minhas emoções, eu posso senti-las sem qualquer pressão por modificá-las. E precisamente essa é a liberdade de que o yoga fala. Não se trata de controlar a mente, mas de ter um conhecimento direto de si mesmo como a consciência distinta da mente, livre dos seus conteúdos.

Nirodha vem da raiz ‘rudh’ com o sentido de ‘avarana’, encobrir, envelopar, abraçar, etc. Em um primeiro momento, yoga é a capacidade de direcionamento da mente, como a capacidade da mente de “envelopar-se” no objeto de concentração, de modo a poder contemplar sobre ele sem interferência de pensamentos “externos”. Isso também é dito como o estado de direcionamento único, ekagrata, da mente. Mas, além disso, nirodha também é a capacidade emocional de abraçar a mente, isto é, de acolhe-la em todas os seus supostos “defeitos”, e conseguir olhar para ela com compaixão. E, quanto maior for a clareza do sujeito com relação à sua natureza livre da mente – clareza essa advinda do estudo das escrituras com a mente qualificada com ekagrata – maior será a sua capacidade de acolher a própria mente sem estar comprometido com ela, como quem compassivamente acolhe uma outra pessoa nos seus eventuais defeitos sem achar com isso que a pessoa mesma é defeituosa.


Texto retirado em 09/08/15 de http://www.vedantaonline.org/yoga-e-controle/

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